Como se promovia uma forte resistência a cultura dos povos originários. Utilizava-se de outras culturas para afastar os índios da sua verdadeira identidade.
Por Evandro Brasil
Durante a XI Conferência Municipal da Assistência Social de Duque de Caxias
nós participantes tivemos a oportunidade de conviver alguns preciosos momentos
com autênticos representantes dos povos originários,os amigos Doethyro Tukano
de 53 anos da etnia de São Gabriel da Cachoeira no Amazonas e Apurinã Xamakiry
de 48 anos descendente da Boca do Acre, também naregião amazônica.
Em uma conversa informal, nossos amigos nos descreveram um pouco das suas
experiências na cidade grande, são eles, também chamados índios urbanos.
Apurinã em uma foto de divulgação |
Apurinã nos conta que esta no Rio de Janeiro há 20 anos, e veio pra cá
motivado por um sonho, trabalhar na televisão. Ele nos diz que desde pequeno se
encantou com a telinha. Veio para o Rio de Janeiro, fez curso de teatro,
participou do “Sítio do Pica-Pau Amarelo” onde interpretou Tomé no episódio “Os
Bandeirantes”. Gravou recentemente o filme Vermelho Brasil da Rede Globo, além
de pequenas participações como figurante ao longo deste tempo que esta no Rio.
Apurinã, afirma que ao chegar na cidade grande enfrentou um grande impacto
de identificação, pois quando se afirma ser índio,as pessoas agem com deboches,
seu sotaque é motivo de risos e chacotas, o que chamamos de “Boolling”. “Na
culturaguarani, muitos índios chegam a suicidar-se por falta de identidade”. Afirma
Apurinã Chamakiry. Neste primeiro contato com os povos aqui no Rio de
Janeiro, ele chegava a negar a sua origem, por vergonha e para evitar o
boolling. Depoisde 7 anos aqui, ele retorna a sua terra na Boca do Acre, e foi
lá, que ele viu a importância de retornar ao Rio de Janeiro e afirmar a sua
origem, sua cultura, lutar pela afirmação, pela preservação da memória e
principalmente pela sua verdadeira identidade.
Em sua estada na Cidade Maravilhosa, e nos trabalhos da televisão como
figurante ele acaba por conhecer outros descendentes da cultura indígena, o que
leva a uma rápida identificação, os constantes encontros dá início a um
movimento de valorização da cultura dos povos originários, e, por volta do ano
2000 inicia uma articulação para conquistar um espaço onde os índios pudessem
expor seus artesanatos e ocupar, promovendo o intercambio social. Naquele
tempo, uniram o estado de abandono do Museu do Índio no Maracanã e a
necessidade dos originários que fez surgir uma nova comunidade com a ocupação
do espaço.
Ele ainda acrescenta que o espaço foi doado desde tempo do Brasil Império
pelo Duque de Saxie e teve e denominação final como resultado do trabalho de
Darcy Ribeiro.
Tukano durante a desocupação da Aldeia Maracanã |
Nosso outro personagem, o amigo Doethyro Tukano, este luta incansadamente desde
os 20 anos de idade pela afirmação de sua cultura. Quando adolescente, em São Gabriel estudava
na doutrina Católica Salesiana, o que ele mesmo define como uma lavagem
cerebral que fez com que muitos outros indígenas renunciassem a sua verdadeira
origem, os jovens indígenas permaneciam 8 meses confinado e 4 meses com a
família. Mas ele também tinha um sonho, e para correr atrás deste sonho
ele vai para Manaus estudar em uma escola preparatória para concurso de
oficiais da Aeronáutica.
Em Manaus, através do Conselho Indigenista Missionário da CNBB (Conselho
Nacional dos Bispos do Brasil), Tukano descobre que existe um órgão chamado
Funai, e, ele lembra que na aldeia a Funai era totalmente desconhecida.
Na primeira visita do Papa João Paulo II, ele foi a Brasília, e somente lá
ele teve a informação de que no Brasil havia outras etnias indígenas, lá
conheceu o Cacique Juruna então deputado federal do PDT. “A doutrina
católica dominava a região dos índios pelo enfraquecimento da Funai e com o
apoio das forças armadas, e servia como uma forte resistência a cultura dos
povos originários. Utilizava-se de outras culturas para afastar os índios da
sua verdadeira identidade” Afirma Doerthyro Tukano.
No ano de 1987 Tukano junto a outros 400 líderes indígenas cria a Federação
da Comunidade Indígena, era mais uma tentativa deresistir e lutar nas grandes
metrópoles pela sustentação dos povos indígenas epela garantia da sua
permanência em seu local de origem. Participa da Assembléia Constituinte e
ajuda a construir o Artigo 231 da nossa Carta Magna. Este artigo trata dos
direitos dos povos originários.
Em sua permanência no Rio de Janeiro, Tukano afirmaque é um andarilho, tem
uma filha que vive no município de Duque de Caxias e que hoje sua filha tem 23
anos, e ele chegou por aqui, em 1997, na ocasião ela tinha apenas 7 anos, e,
desde então, esta no Estado do Rio de Janeiro, onde trabalhou como educador na
Casa do Índio na Ilha do Governador; depois trabalhou também como educador em
Botafogo, no Museu do Índio; no ano de 2007 ele da inicio a um trabalho em uma ONG como educador de
artes, e, no 1º grupo de índios não acadêmicos pesquisador; e desde então
realiza palestras sobre a afirmação dacultura dos povos originários em
universidades, associações etc.
Em um momento de nossa conversa, eu falo de esperança, e ambos me afirmam: “O
desrespeito aos povos originários leva a indignação aos movimentos sociais no
Rio de Janeiro. O Centro de Referência da Cultura dos Povos Indígenas se faz
necessário, veja que até 10 anos atrás os índios urbanos já não eram mais
considerados índios pela sociedade, o Censo do ano 2004 indicava que no Rio de
Janeiro havia 30 mil índios, já o Censo de 2010 indica que no Rio de Janeiro a
população indígena é de 11 mil indivíduos. Temos que derrubar a idéia de que o
índio urbano não é mais índio, lutamos para mudar a visão do povo sobre a nossa
cultura, com a formação de uma política indigenista no país, isso permeia com a
elaboração de novos livros didáticos que reflitam a realidade do índio nos dias
atuais, como ele deve ser verdadeiramente visto.”
Quem também esteve na XI Conferência Municipal daAssistência Social foi o
Secretário Zaqueu Teixeira que afirmou que esta garantida a construção do
Centro de Referância da Cultura Indígena e que vai buscar instrumentos para
acelerar as obras na Colônia Curupaiti em Jacarepaguá.
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